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Ter medo é normal?

Ter medo é normal?

Medo e ansiedade fazem parte da vida de crianças e jovens, mas podem ser patológicos. Conheça os sinais de alerta e como proceder.

Atualizado a 13/03/2023
7 MINUTOS DE LEITURA
Ter medo é normal?

Medo do escuro, medo de animais, medo de ‘monstros’, medo de ficar sozinho ou de não ter amigos: o medo acompanha a criança/o jovem ao longo do seu desenvolvimento, o que é normal. O problema surge quando o medo e a ansiedade tomam conta das suas vidas, mudando-as por completo.

Na verdade, o medo tem uma função no desenvolvimento e ao longo da vida, mas também pode ser um sintoma de que algo não está bem. Os pais e todas as pessoas envolvidas na educação devem estar atentos aos sinais de alerta.

Este é o tema do Podcast Hospital da Luz com Cláudia Chasqueira, psicóloga do Centro de Neurodesenvolvimento e Comportamento da Criança e do Adolescente do Hospital da Luz Lisboa.

O que é o medo?

É uma condição inerente à vida humana. Ter medo (ou medos) é normal e natural, é uma emoção básica e saudável, que faz parte de um processo de desenvolvimento normativo, de crescimento.

O medo ‘na medida certa’ é aquele que prepara e defende a criança, ajudando-a a adaptar-se às dificuldades que vai encontrando. O medo útil tem uma função preparatória: permite agir perante um perigo ou uma ameaça, real ou imaginário, e contribui não só para a sobrevivência do indivíduo, mas também para a sobrevivência da espécie.

Os medos mais comuns

Na sua maioria, as crianças e os jovens manifestam medos que são transitórios e típicos das suas fases de desenvolvimento:

  • Nos dois primeiros anos de vida, o bebé pode reagir com choro perante ruídos repentinos e muito intensos ou então por ficar de repente sozinho.
  • No 2º e 3º anos de vida, é muito frequente a criança ter medo de insetos ou animais pequenos.
  • Na idade pré-escolar, começam a surgir os medos do escuro, de animais em geral, de ficar sozinho e dos seres imaginários (os chamados ‘monstros debaixo da cama’, por exemplo).
  • Na idade escolar, entre os 6 e os 11 anos, com o desenvolvimento cognitivo e emocional, as tipologias dos medos vão-se alterando e a criança passa a funcionar menos no plano imaginário e progressivamente mais no pensamento abstrato. Surgem, então, os medos de ser raptado, dos assaltos, de ficar longe de alguém da sua referência, de se perder num lugar, de ter más notas ou não passar de ano na escola.
  • Na puberdade e até à adolescência, há os medos de falhar nos relacionamentos interpessoais e de não pertencer a um grupo social. Surgem também as preocupações com a imagem corporal (o não corresponder a padrões que supostamente são os esperados pelo grupo social em que se está inserido), com a autonomia, os projetos futuros (a possibilidade de se falhar na escola, na entrada na faculdade ou no curso que se pretende) e as questões da sexualidade.

Como distinguir medo e ansiedade

Medo e ansiedade não são equivalentes. O medo refere-se a uma ameaça (que pode ser real ou imaginária), enquanto na ansiedade o indivíduo tem uma resposta exagerada face a um estímulo, quando não está em confronto com um perigo real.

A ansiedade está associada a pensamentos antecipatórios de que que algo terrível possa acontecer no futuro e vai perdurando em fases do desenvolvimento em que já não é adaptativo, ou seja, em que não é expectável que apresente determinados medos ou preocupações. Falamos de ansiedade então, quando é exagerada, desproporcional em relação ao estímulo e quando interfere na qualidade vida e rotina diária da criança ou do jovem.

A ansiedade pode, porém, ser adaptativa, quando nos mobiliza na direção de um objetivo e melhora o nosso desempenho.

Quando é que a ansiedade e o medo se tornam patológicos?

A ansiedade pode surgir de uma forma adaptativa e até mobilizadora para um objetivo, como vimos, sem interferir com a funcionalidade do dia a dia. Falamos de ansiedade patológica quando os medos e as preocupações são tão intensos e incapacitantes que começam a interferir com o dia-a-dia e com o desempenho de tarefas e, acima de tudo, quando provocam sofrimento psicológico, pois são exacerbados, intensos, sistemáticos e perduram no tempo.

Poderemos pensar, a título ilustrativo, nos medos específicos. Por exemplo, uma criança pode ter medo de um cão com base numa experiência que pode ter sido percecionada como uma ameaça: o cão ladrou, deu-lhe uma lambidela na mão e levantou as patas porque queria uma festa, mas a criança interpreta tais comportamentos como: ‘O cão vai morder-me’. A partir deste episódio, pela resposta automática de ameaça, a criança evita estar na presença daquele cão específico. Daqui, poderá instalar-se uma generalização do comportamento e a criança sentir incapacidade em estar na presença de qualquer cão com o qual se cruze, noutros contextos, e passar a apresentar uma resposta exacerbada de evitamento, com manifestações fisiológicas (por exemplo: transpiração, agitação motora, batimento cardíaco acelerado). Neste contexto, tais sintomas poderão configurar uma fobia específica.

Sinais de alerta

As famílias, cuidadores e todos os agentes educativos – que são quem conhece melhor as crianças e jovens – devem estar atentos a tudo o que são alterações de comportamento ou de rotinas diárias. Por exemplo:

  • Alterações no sono;
  • Comportamentos regressivos (voltar a urinar na cama, por exemplo);
  • Alterações de apetite;
  • Alterações nos cuidados de higiene e vestuário;
  • Mudanças nos relacionamentos com os pares;
  • Decréscimo do rendimento escolar;
  • Isolamento e oscilações no humor (sistemáticas ou exacerbadas).

 

É muito importante:

  • Não desvalorizar e sinalizar as diferenças (estabelecendo um ‘antes’ e um ‘agora’);
  • Falar às crianças ou adolescentes, mostrar empatia com as suas preocupações, validando-as e demonstrando que há forma de procurar e de ter ajuda – primeiro junto de amigos ou de familiares, mas depois até junto de um profissional de saúde especializado, como um psicólogo.

 

 

Consulte o artigo original “Ter medo é normal?” no site Hospital da Luz.

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